Pesquisar e desenvolver procedimentos inovativos e na fronteira do conhecimento para a modelagem e simulação da micromecânica dos constituintes das células e dos dispositivos para sua manipulação e análise.
  
	O comportamento micromecânico das células  vivas possui estreita relação com o papel funcional por elas desempenhado em  órgãos e tecidos de um organismo. Em outras palavras, a função das células em  um organismo depende de suas características biomecânicas em escala  microscópica. Adicionalmente ao movimento celular em suas próprias estruturas,  a motilidade celular também se dá nos fluidos circundantes presentes em seu  ambiente natural, no qual as células se deslocam e se deformam. A pesquisa em  biomecânica celular, portanto, submete as células e seus componentes a forças e  estímulos externos que permitam a realização de microestudos mecânicos. Para  tanto, existem dispositivos microfluídicos, tais como as micropipetas e as  armadilhas de luz, conhecidas como pinças ópticas (optical tweezers, em  inglês), que têm resolução e são estáveis o suficiente a ponto de conseguir  manipular e deformar uma única célula. Permitem medir quantidades físicas tais  como forças (que estão na ordem de picoNewtons) e deslocamentos (nano a  micrométricos). Esses “single-cell experiments” têm um enorme potencial de  descobertas biológicas e médicas, que ainda permanece pouco explorado pela  novidade da tecnologia envolvida. Assim como, hoje em dia, é impensável o  trabalho com estruturas mecânicas macroscópicas sem o auxílio de um software de  computação científica, a necessidade de dispor, para os próximos anos, de  modelos computacionais de estruturas biológicas a escala celular resulta  evidente. Como primeiras aplicações de tais sistemas poderia ser simulado o  comportamento de vesículas ou outras estruturas simples constituídas do  material mais abundante do microbiológico: os fosfolipídios, os quais integram  desde bactérias e células nucleadas, e até mesmo organelas celulares como a  mitocôndria. Assim sendo, poderiam ser oferecidas algumas respostas relativas a  micromecânica de processos celulares fundamentais.  
  Para tanto, a  micromecânica celular carece de métodos computacionais que sejam precisos,  eficientes, robustos e gerais o suficiente para atender as expectativas da  tecnologia experimental já disponível. Nesse aspecto, nos pautaremos nos  modelos físico/matemáticos das membranas celulares já bem estabelecidos e em  nossas últimas contribuições para avançar e manter o estado da arte da  biofluídica computacional alinhado com o da tecnologia experimental. A  ampliação dos horizontes da experimentação virtual – atualmente restritos por  questões de modelagem – será preconizada. Para tanto, serão implementados  modelos físicos de complexidade incremental ao longo do projeto. Eles  considerarão acoplamento mecânico entre a membrana celular e seu citoesqueleto,  possível deslizamento entre as camadas fosfolipídicas interior e exterior,  deformação mecânica de canais iônicos, interação de membranas com proteínas,  etc., na medida que seja julgado importante no contexto científico  internacional. 
Atividades  
  - Estudo  e implementação computacional de modelos avançados para membranas celulares  formadas por bicamadas lipídicas – moléculas estas que formam a matéria-prima  celular mais básica. Diferentes modelos e comportamentos precisam ser  considerados, em particular, modelos governados por uma energia de deformação  elástica e aqueles concebidos via uma energia de curvatura. 
 
  - Incorporação  desses modelos de membranas biológicas em formulações CFD tridimensionais dos  fluidos interior e exterior. Imposição de restrições matemáticas tais como  inextensibilidade (incompressibilidade superficial) e, em se tratando de  membranas fechadas, da interação osmótica do volume interior com o exterior.  Incorporação de fenômenos de adesão seletiva.
 
  - Estudo  teórico-computacional sobre a formação de grandes elongações cilíndricas  (tethers), obtidos mediante aplicação de forças externas em uma pequena parcela  da membrana. Este tipo de problema é de grande importância, já que esta é uma das  técnicas mais utilizadas para medir e entender as propriedades mecânicas das  membranas celulares.   
 
  - Estudo  e implementação de efeitos de curvatura de membranas com borda. Este ponto  faz-se indispensável no estudo de transições estruturais de forma do colesterol  HDL. Na clássica densidade de energia de Canham-Helfrich há de ser adicionado  um termo quadrático na curvatura da curva interfacial, o qual pode ser  interpretado tanto como uma apolipoproteína ou como efeito hidrofóbico de borda  (nesse caso, referindo-se a membrana aberta formada apenas de fosfolipídios). 
 
  - Modelagem  dos efeitos de flutuações térmicas, de maneira a complementar as técnicas de  interferometria óptica, que permitem quantificar com bastante precisão essas  flutuações em células tais como hemácias. Uma aplicação interessante seria o  estudo da transição morfológica de hemácias e a sua relação com mudanças  mecânicas que possam alterar o transporte de oxigênio no sangue.
 
  - Desenvolvimento  do arcabouço de métodos computacionais necessários para a implementação de um  laboratório virtual de bioquímica-mecânica celular microscópica. A  possibilidade de experimentação virtual em processos bioquímicos já existe na  escala molecular (Molecular Dynamics), mas apenas consegue simular processos de  tamanhos nanoscópicos e cuja duração não excede alguns microsegundos. A  factibilidade de simular células completas com MD nos próximos anos é  praticamente nula, já que seu custo cresce com a sexta potência do tamanho  (simular um sistema de 1 micron custa um milhão de vezes mais do que simular um  de 0.1 micron). Por isto, a experimentação virtual na escala da célula deverá  ser feita com modelos contínuos ou quasi-contínuos do tipo que serão estudados  e desenvolvidos nesse projeto. Uma vez avançadas as atividades de pesquisa mais  básica do projeto nos primeiros três anos, concentrar-se-á esforços em  preencher todas as lacunas existentes para acabar com um conjunto de  ferramentas (teóricas e computacionais) completas e integradas para  experimentação virtual. 
 
 
Metas  
  - Até  final de 2017: Desenvolvimento dos modelos computacionais para simulação de  bicamadas lipídicas, incluindo os modelos baseados em energia elástica e de  curvatura. Desenvolvimento de modelos de interação da membrana com a formulação  CFD do fluido ambiente, levando em conta a incompressibilidade superficial e a  interação osmótica entre o interior e o ambiente.
 
  - Até  final de 2019: Desenvolvimento dos modelos computacionais para simulação de  bicamadas lipídicas junto ao citoesqueleto e modelagem do deslizamento entre  camadas fosfolipídicas.
 
  - Até  final de 2019: Estudo teórico-computacional da formação de tethers em  organismos celulares. Calibração dos modelos teóricos via comparação com  resultados de experimentos com micropipetas e pinças ópticas. 
 
  - Até  final de 2019: Desenvolvimento dos modelos matemáticos e computacionais para  estudar efeitos de curvatura de membranas com borda para modelagem das células  do colesterol HDL 
 
  - Até  final de 2019: Estudo e implementação dos modelos para considerar flutuações térmicas.  Calibração dos modelos teóricos via comparação com resultados de  interferometria óptica.
 
  - Até  final de 2021: Caracterização de transições morfológicas explicadas em termos  das mudanças nas propriedades mecânicas dos organismos celulares.
 
  - Até  final de 2021: Desenho e desenvolvimento do pacote teórico/computacional de  experimentação virtual. Escrita de documentação a respeito, provavelmente um  livro e o manual dos programas.
 
  - Até  final de 2021: Finalização do pacote teórico/computacional, transferências a  parceiros, divulgação dos resultados finais.
 
 
Impactos 
  - Os  métodos implementados no projeto possibilitarão análises inversas para  otimização de experimentos e identificação de parâmetros em doenças  relacionadas com a geometria da membrana celular. Sejam as alterações  morfológicas celulares causa ou consequência de alguma patologia, certamente o  acoplamento mecânico entre as estruturas intra-celulares e a membrana celular  exerce um papel central na manutenção do bom funcionamento celular (como de  fato ocorre na malária, na anemia falciforme e na esferocitose). Esse também é  o caso nos processos de adesão celular (ligação entre células, ou de uma célula  a um substrato, tal como matriz celular, etc.).
 
  - Os  modelos desenvolvidos contribuirão não só para o entendimento da mecânica de  células vivas, mas também de lipossomas – vesículas sintéticas formadas  exclusivamente de fosfolipídios e, portanto, o modelo experimental de membrana  plasmática mais adequado para pesquisa básica em biologia e farmacologia. Eles  são também utilizados diretamente na área médica como vetor bioquímico para  transporte de fármacos em seu interior. Os lipossomas permitem potencializar os  efeitos terapêuticos de drogas, pois evitam que o fármaco transportado se perca  no trajeto até o alvo específico (órgão, tecido, etc.), além de minimizar  efeitos colaterais por evitar ação em alvos indesejados. Também permitirá  investigar a estabilidade de configurações estruturais de vesículas de  lipoproteína de alta densidade (High-Density-Protein, HDL), popularmente  conhecidas como “bom colesterol”. Essas áreas carecem de modelagem  computacional, a qual ainda revela-se em estágio inicial de pesquisa do ponto  de vista da computação científica (R. C. Van Lehn, M. Ricci, P. H.J. Silva,  P. Andreozzi, J.  Reguera, K.  Voïtchovsky,  F. Stellacci,  A. Alexander-Katz, Lipid tail protrusions  mediate the insertion of nanoparticles into model cell membranes, Nature  Communications 5, 4482, 2014), mas cresce fortemente nos dias de hoje como  ferramenta de auxílio para a construção de princípios fundamentais mais  quantitativos.
 
 
	                 
                       
                     
                   
                 
	              
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